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Reminiscências de um período negro


Lellis Vasconcelos
Durante a Ditadura Militar de 1973 a 1976 ocorreu a Operação Radar, que foi responsável pela morte de 19 militantes do Partido Comunista Brasileiro. O curta metragem “Uma Família Ilustre”, de Beth Formaggini, se baseia principalmente nos relatos de Cláudio Guerra, agente que participou de crimes como assassinatos e incineração de corpos.
Numa sala escura com imagem de vítimas projetadas, diálogos são conduzidos como fossem confissões pelo psicólogo Eduardo Passos. Com uma bíblia na mão e pedindo para ser chamado de pastor, sua atual ocupação, Guerra fala sobre atividades desempenhadas durante a Operação Radar. Sem transparecer emotividade, ele aponta para pessoas que matou e crime praticados pelo estado, os quais atuou ocultando as marcas. Em certo momento o ex-agente mostra como corpos eram incinerados em uma usina de cana de açúcar, declarando que sempre via os rostos, por simples curiosidade.
Considerando-se um cumpridor de tarefas, Guerra admite que tinha prazer em ser temido mas que agora mudou: “tem gente que não acredita”. Realmente, a calma na descrição dos fatos leva a indagar. O formato utilizado para a entrevista, com a projeção de imagens e a aparente franqueza do anistiado ao elucidar os fatos, faz com que fiquemos atentos a cada declaração.
Em contraponto com a frieza de Guerra está o depoimento da esposa do militante “desaparecido” Itair José Veloso, em nítido sofrimento pela ausência de respostas. Mesmo sem elucidar de forma clara esse enigma, o enlace é válido para mostrar que quarenta anos depois ainda há muito a ser contado e desvendado. E que é fundamental registrar essa memória, para que esse período negro da nossa história não seja esquecido.
* Extraído do site Oficina de Crítica do crítico André Dib.